PERIPÉCIAS
Olhando agora para trás, acho que esta viagem foi, ela mesma, uma autêntica peripécia. A generalidade dos caminhos por onde passei são acessíveis a quem pratique Btt com alguma regularidade. Se juntarmos cerca de quinze quilos de carga, a complexidade aumenta. Se considerarmos, ainda, fazê-la sozinho, poderá parecer um quebra-cabeças.
A preparação que fiz parece-me ter sido crucial para não ter tido qualquer momento de desânimo e muito menos, de vontade de desistir. Senti as maiores dificuldades quando fiquei constipado a partir do 3º dia da segunda parte. Contudo tive a sorte de a constipação não se ter propagado às vias respiratórias inferiores, certamente graças aos antigripais e anti-inflamatórios que tomei de imediato.
Já estava habituado ao transporte da carga que apenas passou a condicionar o andamento, sobretudo nas subidas. Sabia que apenas demoraria um pouco mais de tempo. Mantive sempre grande controle sobre a fadiga, controlando as pulsações cardíacas, não atingindo níveis de cansaço elevado e alimentando-me com método.
A facilidade de operar com o GPS e a sua fiabilidade, foram fundamentais para não perder tempo com a navegação. Com métodos clássicos teria cometido muitos erros e perdido muitas horas. Há sítios de navegação muito difícil, nomeadamente, eucaliptais, estradões novos e cruzamentos confusos. A carta topográfica no GPS foi muitas vezes a grande ajuda.
EU E OS ÓCULOS…
Apesar de já me serem indispensáveis, tenho um relacionamento de desinteresse com eles, pelo que os deixo em qualquer lado. Uso progressivos normais e de sol. Durante a primeira parte usei sempre os de sol. Na subida para o Centro Geodésico de Portugal, em Vila de Rei, porque a chuva era muita, tirei-os e coloquei-os no porta-bagagens do guiador. Contudo, ficaram mal acondicionados e caíram. Por volta das 23 horas, em casa, lembrei-me de que não os tinha visto no final, procurei-os, e nada… Meti-me no carro e fui a Vila de Rei procurá-los e encontrei-os, mas no estado que a fotografia acima documenta…
Na segunda parte da travessia tive que sobreviver sem os óculos de sol graduados. Quando necessário, usava os graduados normais e depois, uns de sol não graduados. Ao Almoço em Juromenha precisei dos óculos para ver a ementa, mas a caixa estava vazia. Vá lá, tinham ficado em Monsaraz…
ONDE VOU DORMIR?
Fazia parte da aventura a não programação dos locais de dormida. Tudo correu sempre bem. Contudo, tinha-me parecido que em Albernoa haveriam várias alternativas para dormir, mas de facto, nem uma pequena residencial… O dono de um pequeno café ofereceu-me uma casa desabitada, mas não tinha água quente… Continuei e minha procura até que parei num enorme lar de terceira idade. A Directora, uma Irmã, imediatamente se disponibilizou para me dar dormida. Depois de muita procura, fiquei numa sala com casa de Banho contígua e num sofá cama e digo-vos que já tenho dormido bem pior… A irmã ofereceu-me ainda cobertores e jantar que não se enquadrava na minha dieta… Foi a única vez que usei o saco-cama.
POR FAVOR… ESTOU NA DIRECÇÃO CERTA PARA…
Nunca senti real necessidade de fazer perguntas aos locais sobre o meu itinerário. Contudo, para provocar conversa, fi-lo muitas vezes. Quando as fazia a grupos provocava, geralmente, autênticas disputas entre eles sobre o melhor caminho. Cheio de vontade de rir, prosseguia, por vezes, para o lado contrário da indicação dada…
CONCLUSÕES
O NORTE E O SUL
É difícil dizer se gostei mais do Norte ou do Sul. São realmente muito diferentes. Há, contudo, aspectos comparáveis. O Norte é muito mais barato que o Sul. No norte as dormidas são mais baratas cerca de 25%, mas de um modo geral são de pior qualidade. Uma refeição completa no Sul custa praticamente o dobro do Norte e é de pior qualidade. No Norte nunca tive necessidade de comprar água (consumia 4 a 5l por dia). No sul tive que a comprar a maior parte dos dias e a que preços…. Achei as pessoas do Norte mais interessadas, simpáticas e hospitaleiras. No Sul era frequente andar 20km e mais sem encontrar uma aldeia ou uma pessoa. No Norte, isso é menos frequente e há mais oferta de alojamento e restauração.
No Norte, a média de gastos diários situou-se abaixo dos 40Euros, mas no Sul ultrapassou os 50Eur.
DO QUE MAIS GOSTEI.
DORMIDAS
- Saramago – Casa de Monsaraz, em Monsaraz
- Albergaria Bética em Pias
REFEIÇÕES
- Bochechas com migas, no Petiscos e Granitos em Monsanto
- Achigã no Café do Mercado em Salvada
LOCALIDADES E VILAS
- Castelo De Vide
- Monsanto
PERCURSOS
- De Castelo de Vide até ao Rio Tejo
- Parque Natural e Montesinho
- Canal do Rogil
PAISAGENS
- Douro Vinhateiro
- Praia da Cordama
- Serra do Espinhaço de Cão
O QUE MAIS ME INTRIGOU
Passei em três grandes complexos hídricos vocacionados para a irrigação que são Meimão, Ladoeiro e Rogil. Junto daqueles complexos não vi qualquer actividade agrícola. Apenas em Rogil vi +/- 100m2 de batata doce.
O Complexo da barragem do Alqueva parece estar em desenvolvimento, mas as únicas culturas visíveis são Olivais (na maioria de empresas espanholas, segundo me diziam) e Vinha.
AO FIM E AO CABO…
Sinto-me muito satisfeito com a forma como esta viagem decorreu. Não a trocaria por outra a qualquer resort no estrangeiro. Estive sempre dependente de mim próprio e respondi bem ao desafio. Foi uma daquelas coisas que se fazem uma vez na vida.
Percorri 1192Km em 14 dias.
A preparação foi essencial para ausência de incidentes. A força de vontade, a perseverança, o espírito de luta foram os principais ingredientes para a conclusão com sucesso.
Já me pergunto qual será a próxima aventura, mas não tenho resposta. Este ano está quase no fim, pelo que só para o próximo ano outros projectos tomarão forma. Fazer mais um Caminho de Santiago é uma probabilidade a que vou, certamente, querer juntar outras aventuras pouco comuns.
VOLTEM AO BLOG PORQUE VOU CONTINUAR COM NOTÍCIAS, AINDA QUE NÃO RELACIONADAS COM A TRAVESSIA.